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Com pandemia, trabalho temporário vira prática nas empresas para repor vagas

Com pandemia, trabalho temporário vira prática nas empresas para repor vagas

22/12/2020 às 10h53 Atualizada em 22/12/2020 às 13h53
Por: Redação
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Uma solução de fim de ano virou a saída para o ano inteiro em razão da pandemia. Sem previsibilidade sobre o ritmo da retomada econômica e da crise da Covid-19, as empresas estão recorrendo à contratação de temporários para repor vagas, uma tendência, que, segundo os especialistas, deve se estender para 2021. De março a outubro, houve aumento de 37% neste modelo de contratação, com 1,3 milhão de trabalhadores temporários, segundo a Associação Brasileira do Trabalho Temporário (Asserttem).

Somente no mês de agosto, foram 197 mil temporários, o maior patamar já registrado desde o início da série, em 2014. De um lado, as empresas buscam minimizar riscos ao repor o quadro de pessoal com contratos de curta duração. De outro, recorrem a modelos de seleção digitais, com uso da tecnologia para evitar os riscos da pandemia. A projeção para o ano é de um total de 1,9 milhão de temporários, alta de 28%. Segundo especialistas, o aumento de temporários, neste caso, não indica maior chance de efetivação.

A pandemia criou uma situação de emergência e insegurança nas empresas, avalia Marcos de Abreu, presidente da Asserttem:

— Elas precisaram se reinventar e buscar alternativas formais para contratar trabalhadores, preservando direitos, mas com fôlego para acompanhar a oscilação da economia.

Maior parte na indústria - Um sinal de que o mercado de trabalho não se comportou como nos anos anteriores é que a maior parte das contratações temporárias (65%) ocorreu na indústria, em segmentos como alimentos, farmacêutica e embalagens. Em seguida, aparece o setor de serviços, com 25% do total, e o comércio, com 10%.

— Historicamente, o comércio é que sempre puxou as contratações de temporários, principalmente no segundo semestre — analisa Abreu.

A BRF, dona das marcas Sadia e Perdigão, contratou mais de 7 mil pessoas no terceiro trimestre, das quais 4 mil são temporárias. Weliton Roberto Shalabi, líder global de Recrutamento na BRF, afirma que parte dos temporários foi contratada para dar conta do crescimento das vendas e parte para cobrir o pessoal do grupo de risco, que teve que ser afastado preventivamente:

— A empresa afastou mais de dez mil pessoas do grupo de risco e busca ativa (por meio da testagem dos funcionários), mas todos mantiveram seus rendimentos e benefícios.

. Foto: .

No Grupo Pão de Açúcar (GPA), cerca de 7 mil colaboradores temporários foram contratados ao longo do ano, com mais da metade das vagas ocupadas no primeiro semestre. Camila Zanchim, gerente de RH do GPA, conta que houve um aumento nas vendas de alimentos com a pandemia, e a demanda acima do esperado exigiu reforço de pessoal:

— Existe a contratação temporária por sazonalidade para datas como Dia das Mães, férias, fim de ano e carnaval, mas esse ano fugiu à risca. Nunca tínhamos contratado 5 mil temporários em dez dias.

A seguradora Porto Seguro lançou em julho um programa de contratação de dez mil temporários e já selecionou cerca de 7.400 profissionais. O projeto inclui um programa de capacitação à distância e renda mensal de R$ 1.500 durante três meses. Os inscritos que não foram selecionados tiveram a chance de fazer mais de dez cursos à distância para apoiar a capacitação e a recolocação no mercado de trabalho.

Carolina Zwarg, diretora de Recursos Humanos e institucional da Porto Seguro, afirma que o programa de contratação de temporários surgiu como um compromisso da seguradora em tempos de incerteza. Há chances de efetivação de alguns profissionais, mas o percentual não é revelado:

— Era importante fazer algo que ajudasse financeiramente as pessoas atingidas pela crise e servisse de espaço para que elas atualizassem os seus conhecimentos, preparando-se para um recomeço.

Na avaliação de Thiago Xavier, economista da Tendências Consultoria Integrada, o momento atual de incerteza em relação à economia favorece o contrato flexível. E a reforma trabalhista de 2017 facilitou a adesão ao modelo na crise:

— A pandemia aprofundou a mudança. Quando se tem incertezas que dificultam a visualização do seu negócio daqui a quatro ou cinco meses, você não se compromete com custos como o de pessoal.

O economista avalia que, no curto prazo, a contratação de temporários pode ser uma saída positiva, se representar o caminho para a carteira assinada de quem estava na informalidade. Mas, se for um profissional com qualificação superior à vaga oferecida, pode ser um sinal de fragilidade da economia.

Fim do auxílio - Com a incerteza diante do aumento do número de casos e de quando chegará a vacinação, a expectativa é que o trabalho temporário continue a ter destaque em 2021. Com o fim do auxílio emergencial, há projeção de impacto negativo sobre o consumo, especialmente entre as famílias de menor renda. Além disso, o setor de serviços é o que mais emprega no país, mas boa parte dos postos depende de atividades presenciais. Segundo Xavier, por ora, a tendência é de flexibilização do emprego:

— O mercado de trabalho vai gerar novos postos, mas deve ser insuficiente diante da quantidade de pessoas que devem voltar a procurar trabalho. É um ambiente incerto em que se deve ter bastante contratação temporária como alternativa para as empresas.

A oscilação entre o emprego informal e a ocupação em uma vaga temporária define a situação de incerteza em que se encontra Marcela Fulgoni, de 44 anos. Depois de trabalhar por dois anos como motorista de aplicativo e particular, Marcela conseguiu um trabalho temporário como cozinheira em um restaurante. No fim de outubro, porém, a casa precisou encerrar as atividades, e ela voltou a trabalhar por aplicativo.

— Não havia muita perspectiva de efetivação lá, então mesmo empregada eu já buscava outros postos de trabalho. Mas agora decidi alugar um carro e voltar para o aplicativo, porque está sendo mais vantajoso do que insistir na tecla da procura pelo emprego e ficar na espera — conta ela.

Efetivação menor - Na avaliação dos especialistas, as incertezas que pairam sobre o comportamento da economia em 2021 tornam mais difícil a efetivação de boa parte desses profissionais.

— Existe todo ano uma expectativa de que muitas dessas vagas temporárias se convertam em vagas efetivas, mas a tendência neste ano é que não haja tantas conversões. Muitas vagas de temporários foram abertas para admitir de uma maneira mais segura devido às incertezas e substituir os efetivos que foram afastados ou demitidos — afirma Paulo Sardinha, presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH).

A CNC projeta que 19,8% dos temporários sejam efetivados após o Natal. Em 2019, a taxa foi de 29,1%. A entidade afirma que a incerteza quanto ao desempenho do varejo, no início de 2021, deve dificultar a efetivação.

Seleção de pessoal pela internet dispara - O crescimento de vagas temporárias, sobretudo em grandes companhias, veio acompanhado do uso da tecnologia para facilitar as contratações. Com a Covid-19, muitas empresas apostaram no uso de ferramentas de inteligência artificial para acelerar processos internos e driblar a distância exigida no período.

Processos de recrutamento, seleção e admissão, que antes duravam semanas ou meses, agora podem chegar a poucos dias. No caso das vagas temporárias, que surgiram como medida emergencial para atender as empresas, foi preciso ganhar agilidade. O resultado disso é um mercado de consultorias e empresas de softwares de RH em expansão.

A Luandre, empresa de soluções de RH, teve aumento de 159,7% na oferta de vagas temporárias, de março a novembro, na comparação com o mesmo período do ano passado. Todos os processos, inclusive, passaram a ser feitos de forma remota, por meio de entrevista e avaliação virtual.

— No início foram as redes atacadistas, na sequência tivemos vagas de saúde em função do aumento da Covid-19. Em seguida, tivemos alta do e-commerce porque as pessoas mudaram a forma de consumir, e o varejo e a logística precisaram reforçar o time por conta da demanda — diz Gabriela Mative, superintendente de Recrutamento e Seleção.

‘Não substitui tudo’ - A Gupy viu a contratação de temporários crescer 23% em novembro, em relação a igual mês de 2019. A empresa de software aproveitou o período para adicionar um módulo de entrevista virtual e entrar na área de admissão digital. A expectativa da companhia é dobrar de tamanho na área de recrutamento no próximo ano.

— A digitalização via inteligência artificial economiza pelo menos 30% do tempo de fechamento da vaga.

A 99Jobs cresceu 122% na oferta de vagas em outubro e novembro em relação a agosto e setembro. A empresa de inteligência de RH tem no portfólio companhias como Itaú e Magazine Luiza, e conta que os processos seletivos foram feitos com entrevistas por vídeo, chatbots, testes on-line, lives e videochat, entre outros.

— Os processos eram 40% off-line e 60% digitais, agora se tornaram ao menos 90% digitais e 10% off-line. Muitas empresas que usavam currículos de papel estão usando a tecnologia — conta Eduardo Migliano, cofundador da 99Jobs.

Paulo Sardinha, presidente da ABRH, alerta que a capacidade de observação não deve ser automatizada e que o modelo remoto é mais indicado para vagas mais simples:

— A tecnologia não substitui tudo, é preciso equilíbrio.

(*Estagiária, sob orientação de Danielle Nogueira)

 

Fonte: Jornal O Globo

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