
Dinheiro doado por fiéis católicos para a construção da nova Basílica do Divino Pai Eterno, no município de Trindade, em Goiás, foi utilizado na compra de três casas onde moraram os pais e os irmãos do padre Robson de Oliveira Pereira, de 46 anos. A acusação consta na denúncia feita pelo Ministério Público do Estado de Goiás (MP) e recebida pela Justiça goiana na última quinta-feira (10).
O pároco é acusado de desviar e utilizar para fins pessoais parte dos donativos destinados à Associação Filhos do Pai Eterno (Afipe), entidade criada para atividades de evangelização, sobretudo a construção de uma nova basílica. Ele e seus familiares tornaram-se réus mas negam as acusações.

Os imóveis custaram, ao todo, R$ 4,08 milhões, de acordo com o MP. As casas ficam no Condomínio do Lago, um empreendimento de alto padrão que possui três lagos com pista de caminhada, cinco playgrounds, salões de festa e de jogos, quatro campos de futebol society, academia, além de quadras poliesportiva, de tênis, de squash e de peteca.
O condomínio fica entre Goiânia e Trindade, nas margens da Rodovia dos Romeiros, uma autoestrada de 17 km que possui 14 painéis representando a Via Sacra. A entrada principal fica em frente ao primeiro desses painéis, visitados por cerca de 3 milhões de católicos que participam da procissão do Divino Pai Eterno, realizada nos meses de junho. A festa religiosa é o principal evento organizado pela Afipe.
Os promotores sustentam que as casas foram adquiridas com dinheiro desviado das doações feitas por católicos para a Afipe. Segundo a denúncia, o desvio ocorreu por meio da GC Construtora e Incorporadora.
Em 23 de outubro de 2015, a empresa que pertence aos irmãos Onivaldo, Bráulio e Gleysson Cabriny recebeu R$ 7,5 milhões da Afipe. A transferência seria para a compra de duas fazendas em nome da GC localizadas no Tocantins. Mas os promotores observaram que o negócio relativo às propriedades rurais nunca foi efetivado formalmente.
Quatro dias após receber o valor milionário, a GC Construtora transferiu R$ 1,13 milhão para uma “laranja” no esquema. Os três irmãos Cabriny também foram denunciados pelo MP. Gleysson é vice-prefeito de Trindade.
De acordo com os promotores, a laranja era Ana Verônica Mendoza Martins. Ela teria utilizado o dinheiro para comprar uma casa no Condomínio do Lago que custou o mesmo valor que recebeu em sua conta. De acordo com o MP, essa residência foi utilizada por José Celso Pereira, de 82 anos, e Elice de Oliveira Pereira, de 76, pais do padre Robson.
“A Afipe comprou uma fazenda por mais de R$ 7 milhões, mas ela tinha sido adquirida anteriormente por R$ 3 milhões, que era o valor real dela. Com essa diferença, eles transferiram o dinheiro para os laranjas comprarem as casas onde os parentes do padre moraram”, afirmou o promotor Sandro Halfeld, do MP de Goiás.
“Alguns desses imóveis depois foram passados até mesmo para o nome da Afipe, mas isso não desfaz a trama feita durante todo esse caminho. Não se sabe se hoje algum dos parentes do padre ainda mora lá, mas eles já moraram”, disse o promotor.
A casa de Adrianne custou R$ 1,26 milhão e fica na Rua Lago 4, no condomínio. De acordo com o MP, esse valor transferido pela GC Construtora para a conta de Rodrigo Mendoza. O laranja pagou o imóvel em duas parcelas: uma de R$ 700 mil, no dia 27 de outubro de 2015, e outra no valor de R$ 564 mil, em 6 de junho do ano seguinte.
As associações mais novas têm o mesmo nome fantasia, Afipe, mas CNPJs diferentes. De acordo com o MP, os recursos utilizados na compra das casas saiu de contas que pertencem a duas Afipes criadas posteriormente.
Membros conselheiros da Afipe foram ouvidos na investigação. De acordo com o MP, quatro deles afirmaram em depoimento que sequer sabiam da existência de pessoas jurídicas distintas.
“Essa estratégia permitiu que o padre ocultasse dos demais associados as atividades e patrimônio em nome das outras Afipes. Além disso o doador não sabia nem mesmo que doava para a Afipe, ele achava que era para a igreja. E na hora da doação ninguém confere o CNPJ, para o doador isso não fazia diferença”, afirmou Halfeld.
Outro lado – Além do padre Robson, tornaram-se réus outras 17 pessoas. Eles são acusados dos crimes de organização criminosa, apropriação indébita, falsidade ideológica e lavagem do dinheiro doado às Afipes.
O advogado Pedro Paulo de Medeiros, que representa padre Robson, afirmou que não há irregularidades e que a Afipe sempre geriu seus bens seguindo determinações da diretoria.
“Nunca houve apropriação, porque nunca houve reclamação. O Ministério Público do Estado de Goiás está reclamando de algo que nem a própria Afipe reclama. Todas essas negociações de compra e venda de imóveis são absolutamente normais no mercado imobiliário”, afirmou o advogado.
O defensor do padre afirmou ainda que confia no trancamento da investigação. Em 6 de outubro, os magistrados da 1ª Câmara Criminal de Goiânia determinaram a suspensão do inquérito. Mas na última segunda-feira (7), a Justiça autorizou o MP a retomar o caso.
“Não foram apenas duas fazendas pelos R$ 7,5 milhões como diz o MP, foram três além de dois apartamentos. Então o preço é compatível. Posteriormente esses imóveis foram repassados e deram lucro para a Afipe. Mas é bom que se diga que os Cabriny não tem nada a ver com a Afipe, e se por ventura a negociação deu prejuízo para eles, isso é problema de gestão da Afipe. Os Cabriny são empresários e vivem de lucro”, afirmou Vasconcelos.
Época não conseguiu contato com a defesa dos parentes do padre Robson. As defesas de Ana Verônica e Rodrigo Mendoza não foram localizados.